“A nossa prioridade são as pessoas”
Em entrevista ao Empresas+®, Fernando Queiroga, presidente da Câmara Municipal de Boticas mostra-se confiante de que, apesar de todas as contrariedades e desafios que têm surgido no decorrer deste segundo mandato, a resiliência e capacidade de superação para ultrapassar as dificuldades que é característica de todos os botiquenses os ajudará a construir uma sociedade mais justa, mas solidária e, sobretudo, mais unida. Tudo porque, “a nossa prioridade são as pessoas”.
Assumiu a presidência da Autarquia, em 2013. Olhando para trás, que balanço faz destes dois mandatos?
A avaliação do trabalho realizado ao longo destes dois mandatos tem que ser feita, obviamente, pelos nossos munícipes. Não podemos ser juízes em causa própria. O feedback do nosso trabalho chega-nos dia a dia, no contacto que temos com a nossa população, e sempre foi nossa preocupação ir ao encontro daquelas que são as necessidades do nosso concelho e das preocupações manifestadas pelos nossos munícipes, realizando os investimentos de forma muito assertiva e direcionada, consentâneos com os nossos recursos e a nossa disponibilidade financeira. A nossa prioridade sempre foram as pessoas e o bem-estar social no nosso concelho.
Quais os principais projetos em andamento neste momento? Que obras pretende ainda terminar?
Um dos grandes pilares da nossa atuação passa pelo desenvolvimento turístico do concelho, quer ao nível da construção e instalação de novas infraestruturas, quer na captação de um maior número de visitantes que seja gerador de mais-valias económicas para a nossa terra. Obviamente que esta nossa estratégia foi bastante condicionada pela pandemia de Covid-19 que assolou o mundo e reduziu praticamente a zero o fluxo de pessoas, prejudicando seriamente o setor do turismo, com reflexos muito significativos ao nível da hotelaria e da restauração, sobretudo. O incremento do turismo converge com a promoção e potenciação dos nossos produtos endógenos, que nos conferem uma identidade própria e fazem de Boticas um território com características únicas. Importa preservar as tradições e o saber fazer, garantindo rentabilidade às atividades relacionadas com o mundo rural, nomeadamente a agricultura e a produção pecuária, que são o garante de um selo de qualidade desta região do Barroso. A criação de infraestruturas de apoio a todas estas atividades assume vital importância, razão pela qual o projecto do Espaço Intergerações e Casa das Associações, uma obra que se encontra em curso e em fase adiantada de execução, se assume como muito relevante, pretendendo transformar-se numa espécie de “centro nevrálgico” a partir do qual será coordenada toda a estratégia de promoção dos produtos locais, com importantes reflexos para a economia local.
Como está a decorrer a transferência de competências por parte do Governo Central? O balanço é positivo? Que competências ainda não foram transferidas?
Procuramos que decorra dentro da normalidade possível, encarando as competências assumidas com muita responsabilidade e sempre na ótica de melhorar a qualidade dos serviços prestados aos nossos munícipes.
Infelizmente, apesar de concordar com a transferência de competências, todo o processo tem carecido de clarificação e do necessário rigor, sem ser acompanhado do necessário envelope financeiro que a transferência de competências impunha, resultando, na grande maioria das situações, num ónus acrescido para os municípios ao nível da gestão financeira. A transferência de competências é planeada pelo Governo apenas no papel, em total desconhecimento com as realidades e necessidades de cada município, o que acarreta dificuldades acrescidas na nossa gestão financeira e dos recursos humanos e na priorização de investimentos para garantirmos o normal funcionamento dos serviços prestados.
Foi por entendermos não estarem reunidas as condições necessárias, nem muito menos satisfeito o “envelope” financeiro inerente a tal, que recusámos a transferência de competências na Saúde e na Ação Social.
Como é que o Concelho está a combater a atual pandemia? De que forma a Autarquia tem ajudado os munícipes?
O Município de Boticas tem vindo a implementar várias medidas no combate à crise, provocada pela pandemia de Covid-19, procurando apoiar, na medida do possível, os sectores mais afetados.
À semelhança do que acontece um pouco por todo o País, os efeitos económicos desta crise fazem-se sentir e é fundamental que possamos apoiar os nossos empresários, em particular aqueles que, por força das medidas restritivas impostas pelo Estado de Emergência, se viram obrigados a manter as portas encerradas. Assim, o nosso apoio passou pela redução e isenção de algumas taxas, redução e/ou isenção do pagamento de água e ainda por alguns apoios económicos, nomeadamente através do programa “Viver Boticas” e da iniciativa “Decoração de Natal”, direcionados ao comércio local. É óbvio que estas iniciativas não permitiram resolver a grave situação em que estão os nossos empresários, mas este foi um sinal de que o Município está ao lado deles e de que tudo fará para minimizar os efeitos desta crise de saúde pública, que é também uma crise económica e social.
O apoio à nossa população centrou-se mais na sensibilização e na disponibilização de informação sobre tudo o que se está a passar no nosso País e em particular no nosso concelho. Informação clara e transparente, sem nada a esconder e tendo apenas como objectivo manter a população focada naquilo que deve ser a grande preocupação: combater esta pandemia e zelar pela saúde e segurança de todos. Naturalmente que toda esta situação obrigou a Autarquia a um esforço extraordinário e à implementação de medidas e serviços adicionais de apoio à população, como a entrega em casa das pessoas, em particular dos mais idosos, de bens essenciais e de medicação, o transporte das mesmas para consultas médicas ou para a realização de testes à Covid-19 e, mais recentemente, para a vacinação.
Em parceria com a Associação Empresarial Mais Boticas entregamos material de proteção aos estabelecimentos e empresários locais e, em conjunto com a Comunidade Intermunicipal de Alto Tâmega [CIM-AT], adquirimos e entregamos material de proteção individual aos nossos profissionais de saúde, nomeadamente do Centro de Saúde, e aos nossos bombeiros, que estão sempre na linha da frente.
Acompanhamos sempre o evoluir da situação, em consonância com as autoridades de saúde, estando em permanente contacto com as instituições do nosso concelho, como as Juntas de Freguesia, a Santa Casa da Misericórdia e o Agrupamento de Escolas Gomes Monteiro, tudo para que possamos atuar rapidamente no sentido de suprimirmos qualquer necessidade. Reforçando esta ligação, criámos uma linha de apoio social e psicológico, assegurada por uma equipa de técnicos da área social e da psicologia, que garantem um serviço solidário e de proximidade junto da população do concelho.
Considera que a atual pandemia já levou ao aumento do nível do desemprego da região?
Felizmente, apesar da situação difícil de muitos empresários, que começam a ver esgotado o seu “pé de meia”, tal ainda não se traduz no aumento do desemprego. Aliás, segundo informação do IEFP, Boticas é o concelho do distrito de Vila Real que apresenta o menor número de desempregados. Tal situação estará relacionada com o facto da maioria do tecido empresarial ser constituído por micro e pequenas empresas, com um número reduzido de funcionários, muitas delas de carácter familiar. Os grandes empregadores do concelho têm mantido a sua atividade, com maior ou menor normalidade, sendo que existem ainda empresários que alteraram ou “expandiram” a sua área de atividade, o que lhes permitiu manter o mesmo número de empregos. Mas, esta é uma situação difícil e que não será simples manter durante muito mais tempo, sendo que tememos que poderão existir alguns negócios que poderão não reabrir, caso a situação se prolongue durante muito mais tempo.
Como tem decorrido a campanha de vacinação no Concelho? A Autarquia presta algum apoio nesta área às entidades competentes?
O processo de vacinação tem decorrido dentro da normalidade e em estreito respeito e cumprimento pelas normas e directivas emanadas pela DGS. Já foram vacinados os utentes e funcionários das estruturas residenciais para idosos, bem como 50 por cento do corpo ativo dos Bombeiros Voluntários de Boticas e das forças de segurança [GNR]. Já começaram também a ser vacinados os idosos com mais de 80 anos e entre os 50 e os 80 com comorbilidades associadas.
A XXIII Feira Gastronómica do Porco, evento emblemático no Concelho, realizou-se este ano, pela primeira vez, exclusivamente com vendas online. Que balanço faz da iniciativa?
A realização exclusivamente em formato online foi a solução encontrada para podermos dar continuidade aquele que é o evento mais emblemático do concelho de Boticas e o resultado final foi deveras positivo, superando todas as nossas expectativas iniciais, sendo compensador constatar que os nossos produtores conseguiram escoar o produto que tinham preparado para o certame, havendo ainda a necessidade de reporem os stocks para responderem aos pedidos dos clientes. Foram contabilizadas cerca de um milhar de encomendas de fumeiro, enchidos e outros produtos locais, gerando um volume de negócios de mais de 50 mil euros.
Ultrapassadas as incertezas iniciais quanto ao novo modelo de vendas, veio a constatar-se que esta foi uma aposta de sucesso, ajudando os nossos produtores a terem alguma rentabilidade da sua atividade e não saírem prejudicados com esta situação, tendo o Município e a Associação Mais Boticas assumido todos os encargos inerentes ao processo de venda, expedição e transação das encomendas. À data, continuam a registar-se encomendas diárias, razão pela qual a plataforma BoticasTem se irá manter em funcionamento, disponibilizando outro tipo de produtos endógenos, como mel, doces e compotas, licores, estando prevista a inclusão de novos artigos, nomeadamente vestuário e calçado, higiene e segurança, floricultura, entre outros. Pretendemos que esta plataforma seja dinâmica, interativa e que tenha atividade regular ao longo de todo ano para, por um lado, satisfazer as necessidades dos compradores e, por outro, contribuir para a dinamização da economia local, sendo este mais um canal de escoamento de produtos.
A Comissão Municipal de Defesa da Floresta Contra Incêndios [CMDFCI] de Boticas já está a preparar a época de incêndios florestais. Quais as principais preocupações e expectativas para este ano?
O nosso trabalho passa, obviamente, pela prevenção e pelo reforço ao nível da vigilância, contribuindo para que exista o menor número possível de ignições e de área ardida. Neste contexto, o trabalho realizado a montante da época de fogos florestais é deveras importante, assumindo grande relevo o trabalho desenvolvido pelos particulares, na limpeza dos seus terrenos, mas também pelas equipas de sapadores florestais, quer municipais, quer da CIM-AT, em acções de limpeza e silvicultura preventiva. É esta a nossa grande aposta e preocupação, que tão bons resultados tem dado nos últimos anos, reforçando também de forma significativa as ações de vigilância, nomeadamente através do protocolo que temos mantido com o Exército, através do regimento de Infantaria nº 19 de Chaves.
A Galp pagou 5,2 milhões de euros por 10% da Savannah que prometeu investir 110 milhões para extrair 200 mil toneladas de concentrado de espodumena, em Boticas, projeto que a Autarquia e a população não querem ver implementado. Considera que a entrada da petrolífera tornará este desafio ainda maior?
Neste processo, há muita informação e contra informação, fazendo questão de ‘camuflar’ tudo o que há de negativo numa exploração mineira e querendo passar para a opinião pública uma imagem idílica e uma ideia de “desígnio nacional” que resolverá todos os problemas do País. Esta é uma “jogada” essencialmente especulativa e mais uma estratégia de aproximar a Savannah do tal desígnio nacional, ao procurar estabelecer parcerias com uma das maiores empresas portuguesas, procurando “colar-se” a alguém com quem os portugueses facilmente se identificam.
Esta parece-nos ser mais uma “operação de charme” do que qualquer outra coisa, até porque me mete alguma confusão uma empresa cuja principal atividade é a comercialização de combustíveis fósseis [petróleo e gás natural] virar-se, sem mais nem menos, para uma actividade como a exploração de lítio, cujo putativo sucesso pode ter reflexos de vulto na sua principal actividade… São tudo jogos económicos, de monopólios e controlo das operações económicas em matéria de energia. E não deixa também de ser interessante constatar que o Estado Português é o segundo maior acionista da Galp Energia…
Mais do que falar, agora, devemos aguardar pelo desenvolvimento de todo este processo, na certeza de que a população e o Município de Boticas continuarão a ser contra a Mina de Covas do Barroso por todas as razões que são já sobejamente conhecidas. Além disso eu, enquanto presidente desta Autarquia, deixarei de tomar posições públicas que defendam a população. Não ando em reuniões secretas, nem a fazer nada nas costas da minha população. Felizmente, a razão e a verdade vêm sempre ao de cima.
É candidato nas próximas eleições? Espera cumprir o seu terceiro e último mandato?
A não ser que possa surgir algo de muito relevante, já que não podemos prever o dia de amanhã, serei candidato às próximas eleições, cumprindo o terceiro mandato à frente dos destinos do concelho de Boticas.
Que projetos ainda não conseguiu concretizar?
O objetivo principal será, obviamente, o de dar continuidade ao trabalho que tem vindo a ser desenvolvido, sempre em proximidade com a nossa população, procurando agir de acordo com as suas necessidades e prioridades, contribuindo para a crescente melhoria das condições de vida e do bem-estar social no nosso concelho.
Concorda com a limitação de mandatos imposta pela lei ou considera que as pessoas deveriam ser sempre livres para escolher os seus eleitos?
Entendo o objetivo da lei e os princípios que estão na sua base, mas julgo que os munícipes deveriam ter total liberdade para escolher os seus eleitos. O povo é soberano e o nosso trabalho é sufragado a cada quatro anos. Só somos reconduzidos se o nosso trabalho for reconhecido e for ao encontro daquelas que são as necessidades dos munícipes. Julgo que não faz sentido terminar um trabalho que a população reconhece como sendo o mais válido para a sua terra. Mas tudo são ciclos. Uns acabam e outros que iniciam. É apenas necessário que quem está nestas funções o faça com “espírito de missão” e sempre na procura do melhor para a sua população e toda a região.
Uma mensagem final para os habitantes de Boticas.
Neste momento de dificuldades acrescidas, ditadas pela pandemia provocada pela Covid-19, que veio alterar, por completo, a nossa normalidade, deixo uma mensagem de esperança, de reconhecimento por todos os sacrifícios feitos e de crença no futuro, confiante que a nossa resiliência e capacidade para nos superarmos e ultrapassarmos as dificuldades nos ajudarão a construir uma sociedade mais justa, mas solidária e, sobretudo, mais unida.