Onde se acrescenta história à História
A AES Arqueologia nasce da vontade e da oportunidade que Sónia Ferreira e Carla Estrela viram e agarraram para promover a divulgação do património do Algarve. Em 2005, e depois de terem ambas frequentado a licenciatura em Arqueologia, a parceria materializou-se e a empresa assentou arraiais em Lagoa. Apesar de Carla ter rumado à Alemanha, a AES manteve-se de portas abertas com o lema de “observar os projetos como pequenos capítulos de uma história maior”.
Aos 39 anos, Sónia Ferreira, “nascida em Lisboa, criada em Alverca do Ribatejo”, dirige os destinos de uma empresa que, até 2012, foi um projeto sonhado a duas. O projeto empresarial não passou incólume perante os efeitos da crise económica com que o país se debateu, mas sobreviveu. A atuar em toda a região do Algarve, a AES debate-se, desde o começo, com a dificuldade em gerir a dependência “inevitável” da construção. O trabalho da empresa encontra-se muito ligado a obras de requalificação urbana, normalmente obras de menor dimensão e que têm, frequentemente, na sua origem “estrangeiros que investem em Portugal”.
Nem sempre bem-vindos, mas indispensáveis
A animosidade e desconfiança no desempenho de funções sempre acompanharam Sónia Ferreira. Apesar da legislação já implicar o envolvimento de arqueólogos nas mais diversas obras, “as pessoas ainda não estão psicologicamente ou culturalmente habituadas” e o primeiro contacto com a área revela, não raras vezes, o pânico.
O desconhecimento, o não saber “o que é que dali vem” provoca receios de várias ordens: “Que as coisas possam parar, que não se faça a obra, que o cliente desista do investimento, custos muito acrescidos”. Sónia lamenta que nem o passar do tempo tenha amenizado as dificuldades. “Ainda hoje, passados estes anos todos, ainda não se consegue conceber a arqueologia como uma parte normal, integrante do processo”. Para que seja possível operar uma mudança neste âmbito, é imperativo, na opinião de Sónia, que todos percebam que os arqueólogos não pretendem impedir que a obra seja desenvolvida, o objetivo é, de facto, “recolher o máximo de informação possível, registar essa informação para garantir que ela fica preservada para sempre”.
Reestruturar para diversificar
A sócia-gerente da AES tem dificuldades em escolher os projetos que mais a marcaram, diz que foram muitos e que todos tiveram a sua importância. Ainda assim, aponta os vários trabalhos realizados na cidade de Silves, que ditaram os primeiros passos da empresa e que destaca “pelo interesse histórico, pelo volume da informação e dos espólios recolhidos”. Destaca igualmente o edifício Mabor, em Portimão, “abandonado há muito tempo” e onde a AES descobriu um importante e vasto complexo industrial romano. Uma obra realizada na baixa de Faro, que “apesar de não terem aparecido muitos vestígios”, permitiu “recolher um serviço de faiança do século XVII, cuja quantidade e estado de conservação em contextos arqueológicos é uma raridade em termos nacionais”, também foi merecedora do realce por parte da arqueóloga.
Quanto ao futuro, e de olhos postos no que está por vir, a perspetiva de Sónia é continuar a trabalhar na área. Todavia a empresa, nos últimos dois anos, “tem-se estado a preparar para se reestruturar e poder diversificar os seus serviços”. Este plano passa por alargar horizontes e apostar na área da conservação e restauro, da museografia e das novas tecnologias aplicadas ao património (designadamente, nos levantamentos fotogramétricos, nas reconstruções virtuais e na realidade aumentada). “Achamos que é o futuro, que a arqueologia é mais do que trabalhar com obras em áreas de sensibilidade arqueológica. É nosso dever conseguir transmitir a nossa herança cultural não só à comunidade local, mas também a quem nos visita”.