Trabalhar em prol do bem comum
Em entrevista ao Empresas+®, Anabela Freitas, presidente da Câmara Municipal de Tomar, faz o balanço deste segundo mandato à frente desta smart and human city.
A autarca considera que, no combate a esta pandemia, em muitos casos, o município teve que substituir o Estado Central na resposta dada, contudo, “o bem-estar e saúde das populações sempre foi o mais importante. Temos que trabalhar em prol do bem comum”.
“A atual situação pandémica interferiu, em muito, naqueles que eram os nossos projetos e objetivos estabelecidos em 2017. O programa que apresentámos para sufrágio estava pensado para quatro anos, porém o aparecimento da Covid fez com que muitos dos projetos que tínhamos em carteira tivessem que ficar adiados, uma vez que tivemos que alocar, não só os recursos financeiros, mas também os recursos humanos da Autarquia a este combate, nomeadamente no apoio que prestámos aos estabelecimentos de ensino, lares, instituições particulares de solidariedade social [IPSS], entre outros”, esclarece Anabela Freitas, presidente da Câmara Municipal de Tomar.
A autarca refere que, apesar do confinamento e de grande parte dos trabalhadores terem ficado em casa em regime de teletrabalho, o serviço prestado não foi mesmo, porque os recursos disponíveis também não o foram. Assim, a edil explica que todas as obras de reabilitação urbana ficaram atrasadas, assim como todos os projetos existente na área da habitação, mais concretamente, de habitação social. “Infelizmente não nos foi possível reabilitar casas com a velocidade que gostaríamos, por forma a conseguirmos atribuir habitação condigna a muito munícipes que ainda não a têm. Estamos a desmantelar um bairro, onde infelizmente ainda não conseguimos realojar 75 pessoas das cerca de 300 que ali viviam”. Anabela Freitas advoga que também não podemos esquecer que a pandemia provocou uma redução muito grande ao nível das receitas que a Autarquia auferia, em consequência dos vários apoios através de um regime de isenções de pagamentos que o executivo atribuiu às empresas e às famílias, “o que fez com que a disponibilidade financeira para este setor também não fosse a mesma. Não podemos esquecer que este investimento estava a ser realizado na totalidade a custas do orçamento camarário, uma vez que não existiam quaisquer fundos aos quais nos pudéssemos candidatar”.
Substituir o Estado
“No combate a esta pandemia temos noção que, em muitos casos, nos substituímos ao Estado Central na resposta dada, contudo o bem-estar e saúde das populações sempre foi o mais importante. Temos que trabalhar em prol do bem comum”, refere a autarca que revela que, logo numa primeira fase, o município atribuiu equipamentos de proteção individual a todas as IPSS uma vez que, em março de 2020, “atingiam preços proibitivos e as instituições não tinham uma tesouraria capaz de suportar esse custo. Não podemos esquecer também a elevada quantidade de computadores e acessos à Internet, mercê a fraca cobertura de rede existente no concelho, que foram adquiridos para que as nossas crianças pudessem ter aulas em casa com alguma qualidade”. Conjugando todos os custos com as isenções e apoios que dados a empresas e famílias, a Autarquia, direta ou indiretamente, já realizou um investimento superior a 1.2 milhões de euros no combate a esta pandemia.
A edil destaca algumas das medidas tomadas pelo município: “Desde logo, isentámos o estacionamento de superfície, sendo que, no caso das empresas, estas ficaram também isentas da avença nos parques cobertos. Conferimos ainda apoio ao nível do pagamento da fatura da água, medida transversal para famílias e empresas. Dinamizámos também diversas medidas específicas de apoio ao comércio e que, indiretamente, apoiaram também as famílias. Assim no Natal, por exemplo, como sabíamos que existiam famílias que não tinham dinheiro para comprar uma única prenda, atribuímos vouchers de 10 e de 20 euros. As famílias adquiriam por 5€ um voucher que valia 10€ em compras no comércio local e assim por diante. Alocámos cerca de 100 mil euros a este programa que originou um retorno de 230 mil junto do comércio, medida que permitiu as muitas empresas sobreviver durante estes meses do segundo confinamento”.
No que concerne ao setor da cultura e turismo, Anabela Freitas esclarece que, nos meses de verão, o concelho continuou a ser muito visitado, ainda que apenas por turistas nacionais, o que permitiu às unidades hoteleiras e da restauração alguma folga económica. “O facto de termos mantido a nossa programação cultural nos meses mais quentes também foi uma importante mais-valia no setor do turismo. Desta forma também conseguimos ajudar muitos agentes do setor da cultura e do espetáculo que existem em Tomar e que tiveram um ano muito difícil, uma vez que foram muito poucos os espetáculos realizados a nível nacional. Como os espetáculos foram realizados no jardim, que funciona como uma espécie de ilha, facilmente controlámos as entradas e assegurámos todas as questões de segurança. Como esta iniciativa foi um sucesso, já programámos realizar eventos semelhantes este ano”.
A autarca divulga que o Executivo também se reuniu com a indústria hoteleira, restauração e operadores turísticos e que foi traçado um plano de desconfinamento. Neste âmbito, a edil apresenta o evento Tomar Check In, que assenta numa campanha que pretende promover o aumento das estadias dos visitantes em Tomar e que terá um custo previsto de 200 mil euros. A campanha vai funcionar entre 1 de maio e 31 de julho e serão entregues vouchers a quem pernoitar mais de duas noites em Tomar: duas noites (voucher de 20 euros); três noites (voucher de 30 euros) e quatro ou mais noites (vouchers de 40 euros). Estes vouchers só podem ser gastos na economia local, quer seja em agentes de viagens, restaurantes, cafés, pastelarias e agentes de animação turística. “Assim todo o investimento é dinheiro que fica em Tomar”. As marcações têm de ser feitas diretamente com as unidades hoteleiras e não através de plataformas.
O problema das “capelinhas”
“A campanha de vacinação não tem sido linear, devido a todas estas questões relacionadas com a segurança de algumas vacinas, o que tem causado desconforto em algumas pessoas. Além disso, julgo que, ao fim de um ano de pandemia, devíamos deixar as «capelinhas». Por exemplo, alguns profissionais camarários de setores como o desporto ou a cultura, como viram reduzido o seu volume de trabalho mostraram-se, desde o primeiro momento, disponíveis para realizar outras atividades como participar nos inquéritos epidemiológicos, realizar trabalho administrativo a emitir declarações de isolamento, entre muitos outros. Assim, que sentido faz agora ter que ser um médico a ligar para as pessoas para agendar a vacinação? Não faz qualquer sentido. Se as entidades nos derem a listagem de contactos estes profissionais desempenham essas funções, libertando os clínicos para atividades bem mais exigentes”, acusa Anabela Freitas.
A autarca revela que as entidades alegam que não podem partilhar os dados devido a questões de confidencialidade, “quando os funcionários camarários também são trabalhadores públicos que estão sujeitos ao dever do sigilo profissional. Além disso nós sabemos onde as pessoas moram, com quem convivem e podemos agilizar esses contactos. Na população mais velha o sistema de SMS não funciona porque muitos não sabem usar o telemóvel dessa forma. Se necessário fosse podíamos articular os contactos com as juntas de freguesia e outras instituições locais e este processo tornar-se-ia muito mais célere e preciso”.
A edil teme que, com este modelo, muitas pessoas terminem esquecidas em todo este processo quando, “em tempo de guerra, não se deveriam limpar armas. Lamento que, ao fim de um ano, continue a existir este trabalho espartilhado, quando estamos todos disponíveis para trabalhar em prol do bem comum. Já partilhei estas minhas preocupações com as várias entidades competentes e nada muda, o que é lamentável. Infelizmente, o corporativismo está de tal forma entranhado na sociedade que nem uma pandemia o conseguiu enfraquecer”.
Apesar dessas vicissitudes, Anabela Freitas advoga que o município auxilia as entidades competentes neste processo em tudo o que é possível e necessário, como é o caso do transporte de todos aqueles que não têm condições para o fazer. No caso das pessoas sem mobilidade esse transporte é realizado pelos bombeiros.
Derrapagens e desemprego
A autarca afirma que o município tem duas formas de financiamento principais. Por um lado, o Plano Estratégico de Desenvolvimento Urbano (PEDU) que se destina à reabilitação urbana no interior da cidade, “onde não se verificaram quaisquer derrapagens orçamentais, apenas temporais que resultaram do facto de vários concursos lançados ficarem desertos. Em alguns casos foi necessário lançar o mesmo concurso três vezes, uma vez que não existem empresas de construção civil disponíveis no mercado e interessadas em realizar estes projetos. Não existe mão de obra também. Assim lançámos esse concurso uma primeira vez com 500 mil euros de preço base, a segunda tentativa já atingiu os 750 mil e a terceira foi para os 1.2 milhões”.
Por outro lado, a edil assevera que o município tem acesso ao financiamento que chega via pacto, ou seja, através da Comunidade Intermunicipal do Médio Tejo sendo que, neste setor, a Autarquia também registou derrapagens nas empreitadas, cujos concursos também ficaram desertos. “Não conseguimos fazer obras se ninguém se candidata à sua realização. Perante isto, conseguimos renegociar as verbas disponíveis e incluir algumas intervenções que não tinham sido tidas em conta numa primeira fase. Neste contexto algumas obras já estão sob análise do Tribunal de Contas, outras estão prontas para análise sendo que noutros casos teremos mesmo que abrir novamente concurso para a sua realização. Assim, dos projetos definidos em 2017 não perdemos o seu financiamento”.
Anabela Freitas lamenta que, apesar de todos os esforços, a taxa de desemprego já esteja a subir em Tomar, “o que faz com que os pedidos de ajuda à nossa Rede Social também tenham vindo a aumentar de forma exponencial. Vários espaços de cariz familiar do pequeno comércio não voltaram a abrir quando começou o desconfinamento. Assim, é natural que o desemprego vá aumentar ainda mais e que, com isso, as dificuldades das famílias também aumentem”. A autarca mostrasse preocupada sobretudo com as famílias que tinham a sua vida perfeitamente estruturada e estável e que, com esta situação de pandemia, se veem numa situação economicamente instável. “Estas pessoas têm vergonha de pedir ajuda, motivo pelo qual a Rede Social e as várias instituições nela envolvidas terão que estar atentas para poderem identificar estes casos e ajudar estas pessoas que não podemos deixar para trás. Assim teremos que encontrar estratégias para chegar até elas e fazê-las perceber que não é vergonha nenhuma ser ajudado pelos outros”, completa.
Futuro promissor
Quanto ao futuro, a edil defende que era importante que o município continuasse a apostar no setor da habitação, não só do ponto de vista social, mas também como ferramenta para a fixação das populações, “desde que esta seja realizada com custos controlados. Sempre que tentamos atrair investimento e trazer empresas para Tomar, uma das primeiras questões dos investidores está ligada precisamente ao mercado do arrendamento que, neste momento, está completamente fechado e onde são pedidos preços exorbitantes, o que faz com que tenhamos muitas casas vazias porque as pessoas não as querem alugar. A verdade é que um quadro especializado de uma grande empresa não quer comprar casa porque o mercado é muito volátil e a sua situação pode mudar de forma muita rápida, razão pela qual a preferência recai sobre o arrendamento”.
Anabela Freitas esclarece que a Autarquia já está a estudar a parceria com um privado responsável que será responsável pela construção de 48 a 50 fogos, de tipologias T1, T2 e T3, que o município irá adquirir para depois arrendar a preços justos. “O mercado das residências universitárias também é deficitário no concelho e muito fechado. A única residência existente está completamente cheia pelo que também será pertinente a construção de um novo espaço”.
Paralelamente, a autarca considera que será importante que o município continue a apostar na reabilitação urbana, não só em habitação, como também em infraestruturas, nomeadamente ao nível do saneamento básico, até porque muitas condutas de água são ainda em fibrocimento. “Também temos que apostar inequivocamente no setor tecnológico, área em consonância com o previsto no Plano de Recuperação e Resiliência e com os fundos comunitários, o que será uma importante mais-valia. A pandemia veio provar que, hoje em dia, se queremos ser atrativos temos que ter acesso às novas tecnologias. Tem que ser possível uma pessoa estar na Albufeira de Castelo de Bode a trabalhar no outro lado do mundo sendo que, para isso, precisa da estrutura tecnológica e da transição digital. Assim, temos que criar as condições para que sejamos, efetivamente, um território mais atrativo, criando um cluster tecnológico, onde sejamos capazes de acolher empresas que laboram neste setor, tornando-nos, cada vez mais, uma smart and human city. O município deve continuar a apostar na mobilidade suave e sustentável. Se as pessoas se conseguirem movimentar sem recurso ao automóvel todos ficamos a ganhar do ponto de vista ambiental”.
Ainda no setor ambiental, a edil afiança que alterações climáticas também não podem ser esquecidas até porque Tomar é um dos 25 municípios portugueses que tem uma Estratégia Municipal de Adaptação às Alterações Climáticas (EMAAC). “Este será um dos desafios mais importantes do século XXI. Assim, com esta iniciativa queremos promover, em todo o território municipal, uma resposta coerente às múltiplas problemáticas relacionadas com as alterações climáticas e colocar o município na linha da frente a nível nacional, no que diz respeito a estas matérias. É importante dotar Tomar de conhecimento e instrumentos capazes de atenuar os efeitos causados pelas alterações climáticas, ao mesmo tempo que informamos e sensibilizamos todos os agentes sociais na perspetiva de contribuir para uma cidadania ambientalmente mais consciente e responsável garantindo assim um futuro mais sustentável. Quem decide os destinos de uma autarquia tem que ter sempre os olhos postos no futuro”, conclui.
Mensagem aos Munícipes
“A melhor mensagem que posso deixar é a de que tenham orgulho em serem tomarenses e que tenham orgulho no seu concelho, uma vez que essa é a melhor publicidade que lhe podemos fazer. Todos temos que ser cidadãos participativos e pensar não naquilo que o concelho me pode oferecer, mas sim naquilo que cada um de nós pode oferecer ao seu concelho”.