“Ser autarca marcou e marcará para sempre a minha vida”
Fernanda Asseiceira, presidente da Câmara Municipal de Alcanena, prepara-se para deixar o cargo que considera ter sido a sua missão durante 12 anos. Privada de uma recandidatura por causa da lei da limitação de mandatos, Fernanda Asseiceira assegura que ser autarca marcou e marcará para sempre a sua vida. Com um sentimento vincado de dever cumprido, quanto ao futuro, a autarca deseja o melhor para o concelho e para todos os seus munícipes, agradecendo, com gratidão, o voto de confiança recebido.
Olhando para trás, Fernanda Asseiceira, presidente da Câmara Municipal de Alcanena, reconhece que os seus 12 anos como autarca registaram alguns períodos difíceis, ainda que muitos outros altamente gratificantes. “A vida autárquica é um desafio diário, onde cada dia é único e diferente, sendo que os bons momentos ultrapassaram, claramente, os menos positivos. Contudo, não posso deixar de recordar os problemas financeiros que tivemos que enfrentar logo no início do primeiro mandato. Esse foi um período difícil de ultrapassar, já que a perspetiva e expetativa foi, que não íamos conseguir fazer nada. Realidade que não podia ser mais díspare daquela que nos levou a concorrer, sendo que estávamos confiantes de que poderíamos levar a cabo, sem constrangimentos, todos os projetos apresentados. Na altura, senti-me quase impotente e frustrada, uma vez que não vislumbrava como íamos conseguir operacionalizar todos os projetos idealizados, tendo em conta o peso que o endividamento tinha nas contas municipais. Tivemos que avançar para a implementação de um Plano de Saneamento Financeiro, que também felizmente foi bem concretizado e cumprido, o que nos permitiu reestruturar a dívida a curto prazo e ultrapassar esta problemática ao longo destes 12 anos”, recorda a autarca. Apesar de difícil, esta foi uma batalha vencida, uma vez que, hoje, a situação económico-financeira da Autarquia é estável. “A nossa capacidade de endividamento a médio e a longo prazo também está completamente estabilizada, conseguimos uma redução da dívida do município, superior a 70 % ”, completa.
Fernanda Asseiceira lembra ainda o difícil constrangimento que teve que enfrentar ao nível do ambiente no território, mais concretamente a qualidade do ar no concelho. “Esta foi uma luta dura que o município assumiu e enfrentou, com coragem, determinação e sentido de responsabilidade, e para o qual tentou encontrar formas da sua resolução, uma vez que estava em causa algo tão básico como a qualidade do ar que a população respira. Assim, desde logo, assumimos o problema e tentámos resolvê-lo com todas as entidades competentes, ao mesmo tempo que envolvíamos na sua resolução os agentes locais, nomeadamente as empresas. Criámos ainda uma empresa municipal focada apenas em todas as questões de natureza ambiental, área na qual trabalha diariamente de forma afincada”, assegura a autarca que acrescenta que o município criou ainda um observatório ambiental, no qual envolveu várias entidades que colaboram na resolução desta problemática, nomeadamente, a Agência Portuguesa do Ambiente, a CCDR LVT – Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional de Lisboa e Vale do Tejo, o Instituto da Conservação da Natureza e Florestas, a Saúde,… “Felizmente, todo o nosso esforço já deu os seus frutos e foram dados passos estruturantes em prol da melhoria do meio ambiente no concelho, ao mesmo tempo que este passo contribui para a competitividade das empresas estabelecidas em Alcanena, uma vez que não há economia que se desenvolva sem um garante da sustentabilidade ambiental e social”.
Apesar de todos os constrangimentos, a presidente reconhece que a maior dificuldade que enfrentou nestes 12 anos foi mesmo a da atual pandemia, “desafio completamente imprevisível e que apanhou todos de surpresa. A pandemia afeta metade do meu último mandato e representa uma contrariedade relevante para alguém que tem uma expetativa de 12 anos para concretizar um projeto autárquico. Esta foi, sem dúvida, a minha maior e mais desigual batalha, enquanto presidente de câmara”.
Em jeito de balanço, Fernanda Asseiceira é perentória: “Ser autarca marcou e marcará a minha vida. Ser autarca é sentir responsabilidade por tudo, missão ainda de maior importância num concelho de pequena dimensão como Alcanena. As pessoas conhecem-nos, encontram-nos na rua e facilmente nos interpelam. Sempre apostei numa governação de proximidade, dentro do que as exigências burocráticas e de representação institucional, me permitiram. Apesar disso, sempre tentei responder a todas as solicitações e trabalhar em todas as áreas, assumindo até as novas competências que têm vindo a ser transferidas. A dimensão humana e a preocupação constante com as pessoas foi sempre muito presente na nossa dinâmica social.”.
O combate à pandemia
No combate à pandemia, a autarca revela que o município teve, desde logo, uma atitude muito proactiva nas mais diversas áreas. “Talvez por isso, ao nível da comunidade, a situação da pandemia esteve sempre mais controlada. Além da distribuição de equipamentos de proteção individual, apelámos sempre à testagem e demos o exemplo, já que testamos os trabalhadores do município de forma regular. Os alunos das escolas, como é público, também são testados regularmente, sendo que as empresas também procedem à testagem dos seus trabalhadores”. Mas a maior arma que temos para este combate agora é mesmo a vacinação.
Apesar de todo o esforço, Fernanda Asseiceira reconhece que a situação mais complexa aconteceu quando surgiu um surto no maior lar do concelho. “Essa foi a nossa maior preocupação, ainda que tenhamos voltado a ter um segundo surto numa outra instituição do concelho, que apesar de tudo, se tornou mais fácil de controlar. Deparámo-nos com muitos utentes e trabalhadores infetados, o que nos trazia preocupações ao nível da sua saúde e dos seus cuidados básicos. Apesar de todas as vicissitudes, tínhamos que ter a certeza que o lar estaria dotado do número suficiente de trabalhadores para que continuasse a ser prestado um serviço de qualidade a todos os utentes infetados e não infetados. O apoio da Segurança Social foi determinante. Paralelamente, tínhamos que garantir que o surto se mantinha confinado ao lar e que não extravasava para a comunidade, o que, felizmente aconteceu. Infelizmente, durante meses, os idosos ficaram privados de visitas e das suas vivências de convívio mais básicas e, apesar disso, foram confrontados com todo este terror, muitos deles sem conseguirem compreender a verdadeira dimensão do que se estava a passar. Foi muito complicada esta situação para os idosos que estavam habituados ao toque, aos abraços, a verem rostos e sorrisos e que, de um momento para o outro, tiveram que lidar com uma equipa devidamente protegida, com equipamentos de proteção individual, pessoas que apenas conseguiam reconhecer pela voz. Infelizmente, apesar da bravura da luta, alguns idosos faleceram. Este processo foi muito doloroso, uma vez que falamos de perdas humanas na comunidade”.
12 anos de forte investimento
“Procurámos fazer sempre mais do que aquilo com que nos comprometemos, mas a verdade é que apresentámos um programa eleitoral que tentámos cumprir. Os nossos compromissos foram concretizados na sua generalidade. Alguns projetos ainda se encontram em curso, com conclusão ainda em 2021, e ficam até novos projetos para serem lançados. Posso mesmo afirmar que, enquanto autarca, e apesar de todas as vicissitudes, desafios e contrariedades que surgiram, procurei cumprir com tudo aquilo com que me comprometi”, garante a presidente que lamenta não ter sido possível deixar concluído o projeto da Fábrica da Cultura. “Adquirimos uma antiga fábrica têxtil que, depois de reabilitada, irá acolher todas as associações culturais da freguesia de Minde, onde se destaca um conservatório de música, uma banda filarmónica centenária, uma casa do povo que desenvolve teatro, entre outras atividades. Esta freguesia tem uma dimensão cultural muito forte. Assim, apesar de não nos ter sido possível concretizar ainda a obra, o projeto está em avaliação e acredito que será uma realidade a sua concretização”.
Referiu ainda que, «gostaria também de ter implementado o Museu do Curtume, mas não houve oportunidade pois para este projeto não conseguimos o apoio comunitário que era necessário. Fica uma equipa que já está constituída e se encontra motivada e a trabalhar para que seja também uma realidade a curto prazo».
Apesar disso, durante estes 12 anos, o município conseguiu captar mais de 30 milhões de euros de investimento com apoios comunitários, que permitiram a realização de obras importantes para o concelho, potenciando o seu desenvolvimento e a melhoria da qualidade de vida das suas populações. “Esta foi outra luta importante que travámos: ter vários projetos, apresentar candidaturas, fazer a articulação com as mais diversas entidades, tudo para que as candidaturas apresentadas fossem aprovadas, lançar os concursos e acompanhar as obras. Estes investimentos aconteceram em todas as áreas: escolar, proteção civil, ambiente, habitação, setor social, rede viária, espaço público, entre outros. Conseguimos, por exemplo, reabilitar quase todo o parque escolar concelhio. Temos ainda uma candidatura apresentada para aprovação, para intervenção numa outra escola em Minde, e uma outra candidatura para reabilitar a Escola Secundária de Alcanena, sendo que o financiamento já está garantido para ambas. Sempre quisemos ser parceiros, para assegurar a qualidade do ensino que se regista no nosso concelho. É por isso que estamos envolvidos num projeto intermunicipal de combate ao abandono e de promoção do sucesso escolar”, destaca a autarca.
De acordo com Fernanda Asseiceira, o município também realizou investimentos ao nível da proteção civil, resposta que está devidamente equipada e apetrechada. “Somos também um dos concelhos da região com uma maior cobertura ao nível do saneamento básico, estando esta fixada acima dos 95%. Estão ainda a decorrer obras que se encontram em fase de conclusão. Deixo ainda dois projetos elaborados para duas das localidades mais pequenas, o que nos permitirá assegurar uma cobertura de saneamento quase total”.
Para além disso, com recursos a fundos comunitários, o município também tem vindo a renovar a sua frota, através da aquisição de veículos elétricos. “Queremos dar o exemplo e colocar em prática uma ação concreta de descarbonização e de promoção de uma mobilidade ecológica”, assegura a autarca que acrescenta que, ainda a nível ambiental, o Executivo investiu cerca de seis milhões de euros na reabilitação de uma rede de coletores de saneamento. “Como a indústria dos curtumes tem uma forte componente poluente estas infraestruturas estavam já muito degradadas, devido à fraca manutenção que tiveram ao longo dos anos, pelo que procedemos à sua reabilitação, com recurso a apoios comunitários”.
Segundo a presidente, as IPSSs do concelho também têm uma grande dinâmica e a Autarquia sempre as apoiou, quer na ampliação de instalações e/ou na construção de novos espaços. “Ainda este ano será inaugurado um novo lar para reforço desta resposta no concelho. De ressalvar ainda que foi apresentada uma candidatura ao PARES – Programa de Alargamento da Rede de Equipamentos Sociais para a criação de uma nova resposta. Queremos que se concretize a construção de um lar residencial para pessoas com deficiência, numa parceria que estabelecemos com o Centro de Reabilitação e Integração de Torres Novas. Há anos que esta instituição acolhe diariamente, utentes do nosso concelho, daí a pertinência da criação de um pólo local, por forma a evitar a deslocação diária destas pessoas, promovendo a proximidade junto das famílias destas crianças e jovens”, sublinha.
Futuro auspicioso
Quanto ao futuro, a autarca esclarece que aguarda ainda a abertura de candidaturas para apoio ao investimento que o município realizou em equipamentos de proteção individual no âmbito da atual pandemia. “Esperamos ser comparticipados por esta despesa que foi ainda significativa tendo em conta o nosso orçamento anual. Apesar disso não olhámos a custos até porque o mais importante era proteger as pessoas. Distribuímos equipamentos de proteção individual pelas nossas corporações de bombeiros, IPSSs, e oferecemos máscaras a toda a população mais carenciada. Não queríamos que a falta de recursos económicos levasse alguém a ficar menos protegido. Sempre quisemos garantir que a nossa população andava sempre protegida”.
Para além disso, no âmbito do novo Plano de Recuperação e Resiliência (PRR), Fernanda Asseiceira revela que o município já assegurou cerca de oito milhões de euros para o setor da habitação, através da sua Estratégia Local de Habitação, para integrar as candidaturas ao Programa 1º Direito, com o objetivo da reabilitação e do aparecimento de mais habitação, quer por iniciativa de privados, como de IPSSs e do próprio município. “Está já assinado um acordo com o Instituto da Habitação e da Reabilitação Urbana, I.P. (IHRU) com esse objetivo”, assegura.
A nível ambiental, Fernanda Asseiceira destaca que também já está previsto um investimento na ordem dos cinco milhões de euros para que o município seja capaz de responder de forma ainda mais resiliente a todas as problemáticas ambientais que afetam o concelho. “Queremos promover maior garantia de qualidade do nosso ar, assim como maior proteção dos nossos recursos hídricos, nomeadamente, o Rio Alviela. Assim, em várias áreas, para além de todo o trabalho já realizado, muito fica já a decorrer e diversos projetos estão já programados para o futuro, havendo até candidaturas prontas para aprovação, como referi. Quem me suceder iniciará funções numa situação muito favorecida e privilegiada, realidade muito diferente daquela que encontrei em 2009 quando tomei posse pela primeira vez”, conclui.
Mensagem a todos os munícipes
“Deixo uma mensagem de grande gratidão, a todos os munícipes do concelho de Alcanena, por terem confiado em mim, nas minhas capacidades, qualidades e competências e nas equipas que me acompanharam durante todo este período. Apesar de ter sido eleita sempre com maioria absoluta, a verdade é que, procurei ser verdadeiramente presidente de todos e para todos. Deixo ainda o meu agradecimento, pelo voto de confiança que me foi dado. Contudo, não posso deixar de dizer que, para além de um sentimento de missão cumprida uma vez que fiz o melhor que estava ao alcance realizar, sinto já saudades desta dinâmica, sobretudo das pessoas, das equipas e das entidades com quem trabalhei de forma muito próxima e que comigo também trabalharam. Por fim e é o que importa verdadeiramente, desejo o melhor para o futuro do concelho de Alcanena e para todos os que já o escolheram ou venham a escolher, e espero que sejam muitos, com as condições já criadas, nomeadamente em termos de planeamento e ordenamento do território, para nele residirem, trabalharem ou investirem”.
“Somos eleitos e não nomeados”
Fernanda Asseiceira não concorda com a lei da limitação de mandatos e explica porquê: “Somos eleitos e não nomeados. No caso das autarquias, as pessoas estão muito conscientes da escolha que fazem, uma vez que conhecem muito bem as pessoas envolvidas, convivem e conversam com elas.
As pessoas sabem muito bem quem querem à frente dos destinos de uma autarquia e mostram essa vontade através do voto. Assim, considero que esta lei da limitação de mandatos foi excessiva e discriminatória, pois aplica-se única e exclusivamente aos presidentes de câmara e de juntas de freguesia. Para além disso, a haver uma limitação de mandatos de 12 anos, considero que seria mais benéfica a existência de dois mandatos de seis anos, em detrimento de três de quatro anos. Outra possibilidade seriam três mandados de cinco anos cada, o que levaria a limitação para os 15 anos. Garante outra estabilidade, refere”.