Desafio de futuro: criar emprego e fixar população
José Meneses cumpre o segundo mandato como presidente da Câmara Municipal de Angra do Heroísmo. Apesar de asseverar que este foi um mandato exigente, por causa da pandemia, o autarca está já focado nas exigências do futuro: “Temos que conseguir fazer a transição de uma Autarquia centrada nas infraestruturas, para uma Câmara mais centrada no fomento da atividade económica e na estabilização socioeconómica do Concelho”. O presidente reconhece que, nas próximas décadas, o Município terá que ser capaz de fomentar a criação de emprego, por forma a conseguir fixar a população.
Em jeito de balanço, José Meneses advoga que o aparecimento da pandemia condicionou muito o atual mandato, uma vez que atingiu o concelho precisamente na sua segunda metade, “tempo normalmente de maior atividade e com maior volume de concretização de obras. Se os dois primeiros anos são usados para delinear e lançar projetos, estes são concretizados no decurso dos dois anos seguintes. Com o surgimento da Covid-19, se a maioria dos investimentos físicos, ou seja, as obras foram realizadas, todos os investimentos culturais e desportivos tiveram que ser repensados e acabaram protelados”. O autarca sublinha que, depois do Carnaval de 2020, a atividade central da Autarquia passou a ser o combate à pandemia e o apoio a empresas, instituições e população em geral. “Era importante concentrarmos o nosso apoio na componente social e nas pessoas. Fomos a primeira ilha do Arquipélagos dos Açores a registar, formalmente, infetados, daí que a paragem de toda a atividade tenha sido praticamente imediata. De um dia para o outro passamos de uma vida normal, para uma paragem quase total”.
O presidente reconhece que o concelho foi muito rápido a reagir e a adquirir e distribuir equipamentos de proteção individual (EPI) por toda a população. O autarca explica que isso aconteceu porque o Município tinha prevista uma grande encomenda de materiais por causa das danças de Carnaval que se realizam em Angra do Heroísmo. “As costureiras já estavam contratadas por isso, de imediato, deixaram de se dedicar ao fabrico de roupas para o corso carnavalesco e passaram à produção de máscaras comunitárias, até porque estas não existiam no mercado. A procura superava largamente a oferta. Com esta nossa solução quase que conseguimos assoberbar o mercado local num curto espaço de tempo, o que se instituiu como uma importante mais-valia. Além disso, desta forma, muitas pessoas conseguiram manter a sua atividade durante algum tempo, o que foi outra vantagem”.
Apesar disso, José Meneses está confiante que o concelho conseguiu manter o número de contágios controlado durante muito tempo graças ao comportamento exemplar da população que “rapidamente percebeu a gravidade desta doença e atuou em conformidade com esse facto, cumprindo todas as recomendações das autoridades de saúde. Felizmente, os nossos munícipes reagem rapidamente perante a adversidade. Assim, sempre que surge um possível surto, de imediato, as pessoas alteram o seu comportamento e adotam uma postura preventiva. A verdade é que a pandemia, na Ilha Terceira, fica profundamente marcada pelo civismo da nossa população que sempre que sente a ameaça mais perto toma as medidas necessárias e, rapidamente, as situações ficam resolvidas e as linhas de contágio são interrompidas”.
Mitigação da pandemia
No sentido de mitigar as consequências da pandemia, de acordo com o presidente, a Autarquia adotou duas ordens de medidas, uma voltada para as pessoas e outra para as instituições. Quanto às famílias, o Executivo criou um apoio direto a todos aqueles que ficaram desempregados ou em regime de lay-off simplificado por causa da Covid-19. Assim, todas as famílias que registaram perdas significativas de rendimentos, durante alguns meses, ficaram isentas do pagamento do consumo de água, entre outras ajudas que a Autarquia implementou e que “estavam viradas para as pessoas”. Já no que concerne às instituições, o apoio foi dividido em dois grupos: o comércio e atividades de porta aberta, onde o Executivo ajudou as empresas que, devido à Covid-19 e ao confinamento tiveram que fechar portas, através de um conjunto de isenções e outros apoios; e as instituições do setor social e da área cultural, “onde a Ilha é muito rica”, que a Autarquia apoiou através da atribuição de subsídios no valor de 5000 euros, pelo menos, de seis em seis meses.
“Ajudámos ainda as instituições do setor cultural e os artistas locais a manterem a sua atividade, através da dinamização de uma série de concertos transmitidos por via televisiva. De ressalvar que as atuações foram pagas com o valor de um concerto normal. Esta medida permitiu que, ao longo do último ano e meio, a atividade cultural da Ilha não tenha estagnado. Mesmo as atividades tradicionais que todos os anos são dinamizadas, nomeadamente as Festividades do Espírito Santo, traço mais marcante da nossa religiosidade, foram realizadas. Conseguimos manter a tradição da distribuição do pão e do vinho por toda a população, em estreita colaboração com as irmandades das diversas freguesias. Assim, tanto em 2020 como em 2021, apesar de todas as vicissitudes, as nossas tradições decorreram dentro de alguma normalidade”, afirma José Meneses.
O autarca admite que a exceção foi a área da tauromaquia, “da qual somos muito aficionados, e onde sentimos vários constrangimentos. Só conseguimos dinamizar as chamadas touradas de praça, onde conseguimos controlar as entradas e a circulação das pessoas, mantendo as medidas sanitárias necessárias. As nossas famosas touradas de rua, mais conhecidas como touradas à corda, infelizmente, tiveram que ficar suspensas, uma vez que não conseguimos controlar os participantes. Este facto penaliza a nossa tradição e a economia local, uma vez que, só no concelho de Angra do Heroísmo, por norma, acontecem mais de 200 touradas à corda todos os anos. Apenas em 2020, valor que já conseguimos apurar, a pandemia teve um impacto superior a dois milhões de euros nas contas da Autarquia. A nossa expectativa é que esse valor se fixe no milhão de euros, em 2021”.
No que concerne à campanha de vacinação, o presidente sublinha que esta está a decorrer de forma positiva, “depois de uma fase inicial em que se registaram algumas hesitações, situação transversal um pouco por toda a Europa. Depois de um arranque relativamente lento, entrámos numa fase de aceleração. Atualmente, registámos novamente um decréscimo, contudo, este prende-se com a estratégia que foi adotada nos Açores e que prevê que as primeiras ilhas a serem vacinadas são aquelas que não possuem um hospital, decisão que considero razoável”.
Desafio: fixar a população
Quanto ao futuro, José Meneses defende que seria pertinente que a Autarquia terminasse um conjunto de iniciativas que foram lançadas. Ao nível das infraestruturas, “a obra mais emblemática que pretendemos operacionalizar está ligada à reestruturação do mercado municipal, onde pretendemos criar um silo automóvel, sendo que o mercado será reconstruído por cima dessa nova área de estacionamento da cidade. Este será o nosso maior investimento ao longo dos próximos quatro anos, sendo que espero que esta obra possa ser financiada por fundos europeus no âmbito do novo quadro comunitário de apoio que irá entrar em vigor”.
O autarca destaca ainda que o Executivo pretende terminar uma série de obras que estão já a decorrer, nomeadamente de abertura de vias e espaços em direção ao mar, “criando uma melhor relação entre os nossos povoados e esta mais-valia inestimável que temos. Esta é uma iniciativa que está a correr muito bem, contudo, ainda temos alguns troços a realizar. Não podemos esquecer também todas as iniciativas que temos relacionadas com o setor cultural e social sendo que estas são aquelas que, na atualidade, serão as mais importantes devido à desejada recuperação desta crise causada pela pandemia que exigirá das autarquias muito foco e assertividade nas respostas”.
O presidente explica que, ao longo de todo este percurso, as câmaras acabaram por desempenhar um papel central no fomento da atividade económica e na ajuda à manutenção da atividade, “daí que nos estejamos a preparar para adotar uma postura mais robusta na recuperação económica. Temos que criar condições para que, no Município, exista melhor emprego e que este seja remunerado de forma justa. De acordo com os resultados obtidos no último Censos, estamos alinhados com a média do Arquipélago, contudo, existem sinais que indicam que estamos a perder população, realidade que temos que contrariar”. José Meneses reconhece que, inevitavelmente, o concelho irá continuar a perder população ao longo dos próximos anos, “dada a forma da nossa pirâmide etária. A nossa perda de população não acontece tanto por causa da emigração, mas sim devido ao envelhecimento da população e à baixa taxa de natalidade. Assim, temos que cativar a vinda de pessoas de fora, através da dinamização de iniciativas como o Parque de Ciência e Tecnologia da Ilha Terceira – Terinov que já criou mais de 200 postos de trabalho qualificados, desde agosto de 2019. Falamos de mão de obra jovem e qualificada que optou por construir, na Angra do Heroísmo, o seu projeto de vida. Ainda assim, precisamos de duplicar esta capacidade, sendo esse o maior desafio que teremos que enfrentar ao longo das próximas décadas. Teremos que conseguir fazer a transição de uma Autarquia centrada nas infraestruturas para uma Câmara mais centrada no fomento da atividade económica e na estabilização socioeconómica do concelho”, conclui.
Sistema eleitoral focado na pessoa
Questionado sobre a concordância ou não com a lei que determina a limitação de mandatos, José Meneses explica que, no caso dos Açores, esta é quase transversal a todos, uma vez que o presidente do Governo Regional também está abrangido por ele. Ainda assim, o autarca defende que deve ser feita a distinção entre os cargos de natureza executiva dos cargos de natureza legislativa e deliberativa. “No caso das assembleias julgo que pode haver lugar para uma espécie de senadores, pessoas com uma larga experiência que podem e devem continuar enquanto o povo quiser e enquanto os candidatos tenham essa disponibilidade e vontade. O mesmo acontece com a Assembleia da República onde não vejo grande vantagem na constante decapitação. As pessoas que têm experiência, que conhecem a história legislativa e os diversos dossiers, devem ter a possibilidade de se manter no desempenho desse cargo se essa for a sua vontade e se os eleitores reconhecerem a mais-valia que resulta da sua presença. Claro que aqui podíamos entrar depois da questão dos mecanismos partidários de seleção dos candidatos. Contudo, admitindo que jogamos num campo aberto e justo, onde os candidatos são escolhidos em função do mérito, é razoável que não exista a limitação de mandatos. Temos que valorizar quem traz a experiência do passado. Já no caso dos ministros, julgo que deveriam ser aplicadas as mesmas regras daqueles que têm funções executivas, onde o limite de 12 anos é perfeitamente razoável”.
José Meneses afiança ainda que esta não é uma questão premente na atualidade e que existem questões mais importantes a debater e a alterar no sistema político português, “como a melhoria da capacidade dos eleitores para, de forma informada, escolherem aqueles que os vão representar no Parlamento e nas assembleias municipais e de freguesia. Neste momento, o povo fica apenas com a segunda escolha, uma vez que a primeira é realizada pelos decisores partidários. Assim, era importante criar um sistema eleitoral mais focado na pessoa e menos na lista, ou seja, que permitisse às pessoas a escolha de uma pessoa em concreto para que esta seja a sua deputada ou representante numa assembleia municipal. Com a composição das listas que, neste momento, é apresentada ao povo de forma fechada, o sistema não é tão democrático quanto podia ser. Conheço várias pessoas que seriam excelentes deputados e que nunca o foram, não por decisão popular, mas devido a outro tipo de decisões, o que não faz sentido”, completa.